Imagem: Ilustrativa
Elza Gonçalves de Brito é professora aposentada, ex-diretora de escolas da rede pública e observadora assídua do comportamento humano.
“Como professora e administradora escolar, adquiri o hábito de pensar as pessoas como fontes maravilhosas de sentimentos e reações nem sempre expressadas de forma fácil de se compreender. Continuo convivendo diariamente com as crianças, embora em doses homeopáticas (risos). Das turmas com 30, 35 por hora em sala de aula ou até de 1200 por dia na direção de escola, passei a dois diariamente, meus netos, um com quatro e outro com dez anos. Com eles ainda aprendo a ver o mundo como algo mágico que se oferece para ser desbravado. Com os adultos procuro exercitar a compreensão e aprender a força de se lidar com a realidade”
Dentre as coisas que gosto de ter perto de mim, para cuidar, observar e aprender com elas estão os gatos. É uma descoberta quase recente, uma vez que apesar de sempre gostar de animais até bem pouco tempo eu ainda não havia me decidido a ter um gato sob meu teto. Houve sim uma experiência anterior, mas o gato não era da minha casa, foi um hóspede, quase um inquilino indesejado que eu só aceitei por pouco tempo e com a condição de que seria novamente remetido ao lar da verdadeira tutora, assim que ela terminasse o período de mudança e tivesse novamente um teto fixo para oferecer ao seu bichano.
Tenho algumas lembranças desta época, algumas bem engraçadas, outras quase trágicas. Já que estou fazendo esta viagem de resgate de memória, quero incluir aqui algumas destas lembranças.
Para estabelecer o contexto em que tudo aconteceu, tenho que relatar que, nesta época, eu trabalhava o dia inteiro fora de casa. Numa verdadeira turnê por Belo Horizonte onde o meu dia começava me acordando às 06:00h, para o primeiro turno da escola da manhã, e só terminava quando eu voltava para casa, ali pelas 22:30h, após ter terminado o terceiro turno de trabalho no terceiro bairro onde eu cumpria os dias letivos do ano escolar.
Nesta última jornada diária, ia para a escola onde eu lecionava para o EJA (Educação de Jovens e Adultos). Este, talvez um dos trabalhos mais prazerosos que tive, uma vez que entre os alunos estavam adolescentes, adultos e pessoas já em idade mais avançada, cada uma com o seu motivo para estar numa aula de aprimoramento de alfabetização depois de um dia desgastante, em que tinham que cumprir, eles também, suas próprias jornadas de trabalho.
Portanto, dá para perceber bem o pouco tempo que eu tinha para estar em casa. Lá o Felline passava a manhã com a minha ajudante doméstica e a tarde ele tinha a companhia de dois adolescentes, ambos com seus 14 para 15 anos de idade, o mais velho meu próprio filho e o mais novo, meu sobrinho filho do irmão que foi o pai que eu conheci na vida. Eram os meninos os verdadeiros companheiros do meu hóspede temporário.
Bem, dito isso espero que compreendam que eu tinha pouquíssima intimidade com o lindo gato branco que ali recebi. Faço questão de dizer gato branco, pois o que mais chamava a atenção no Felline era a pelagem maravilhosa que cobria seu grande corpo fujão.
Era um passeador nato. Ele saía pela grade da janela da sala e ia direto se enfiar embaixo dos carros no estacionamento... debaixo dos carros estacionados, óleo, Felline, pelo branco, fuligem de escapamento... Era uma mistura fatal! Cansado e com fome ele pulava de novo a janela e entrava em casa... imundo, colento, fedido de tudo aquilo que trazia grudado em seu maravilhoso e longo pelo antes branco. Resultado, eu chegava em casa e me horrorizava com a sujeira, pegava o Felline e lá ia ele para o banho de tanque.
Banho nele e sessão de terror para mim. Ele odiava e fazia questão de demonstrar isso fazendo o maior dos escândalos, injuriado, pulando e tentando fugir. E, no caminho dos pulos, lá estavam meu braço, minha mão e até meu rosto devidamente arranhados, às vezes sangrando de tão veementes protestos.
A parte engraçada também existia e isso ficava por conta das brincadeiras com os meninos e até comigo também. Aqui eu faço uma pergunta, sério, preciso saber quem já passou pela mesma experiência:
-Você já tentou ensinar um gato adulto a andar de peitoral e guia?
Eu tentei.
Vi uma linda guia com peitoral em tecido jeans e logo comprei, imaginando poder passear com o Felline nos fins de semana ou mesmo ensiná-lo a usar aquilo quando voltasse para a sua casa. Outra pergunta:
– Já viu um carro derrapar com as quatro rodas travadas? Pois é, foi assim que terminou esta história do prazeroso passeio com o gato de guia.
Com os meninos passando mal de rir observando, de longe, as minhas fracassadas tentativas de adestradora de gatos. Puxando um gato absolutamente tenso e teso, com as duas patas dianteiras esticadas, durinhas na frente de um enorme traseiro peludo, apoiado nas patas de trás que imitavam a infame posição das companheiras da frente... a linda guia jeans foi doada para o poodle toy de uma aluna minha.
Faço uma pausa no relato que continua na próxima semana. Descobri que entre o Felline e o motivo de escrever sobre as minhas gatas atuais tem história demais para contar. Até a próxima quarta-feira...
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